Resumo

Preâmbulo

Lista de Figuras

Lista de Siglas

Introdução

Primeira Parte: A fronteira
e a Comunicação

1 Caracterização
do Objeto de Pesquisa

1.1 Identidades
e Espaços de Fronteira

1.2 Cultura, ideologia
e meios de comunicação


2 Contextos de Inserção
do Objeto da Pesquisa

2.1 Fronteiras Vivas
2.2 Pólos de Integração
2.3 Caracterização Geral
2.4 Jornalismo e Mídia
Impressa


3 Abordagem Metodológica
3.1 Táticas de
Aproximação do Objeto

3.2 Passos Concretos

4 Vozes sobre as Relações
na Fronteira

4.1 Uruguaiana-Libres
4.2 Santana do
Livramento-Rivera

4.3 Comparando os
Dois Espaços


5 Caracterização dos Jornais
5.1 Jornais de Uruguaiana-
Libres

5.2 Jornais de Livramento-
Rivera


Segunda Parte: A fronteira
na mídia local impressa


6 Análise dos Textos
Selecionados

6.1 A Fronteira
6.1.1 Preliminar: diferentes
usos da expressão fronteira

6.1.2 Fronteira como
amálgama cultural

6.1.3 Fronteira como
transcendência do local

6.2 O fronteiriço
6.2.1 Nós, ou brasileiros ou
argentinos ou uruguaios

6.2.2 Nós todos
6.2.3 Nós, da região
fronteiriça ampliada

6.2.4 Nós, semelhantes
implícitos


Conclusões

Anexos

Referências




5 Caracterização dos Jornais


Atualmente, cada jornal impresso define sua forma de apresentação, com base em pesquisas sobre o seu público-alvo e formatos que vem sendo desenvolvidos na trajetória desta mídia em particular. Os recursos visuais utilizados, a composição das matérias, a distribuição das notícias nas páginas, tudo deve funcionar de modo a sintonizar os interesses da empresa, de seus anunciantes e de seus leitores. Vemos cada vez mais a mídia impressa buscar recursos que a tornem mais atraente e cativem uma gama maior de leitores, fidelizando sua audiência. Os diferenciais são criados e instituídos, tornando-se com o tempo, marcas reconhecidas pelo público ao qual se destina. A disputa pelo mercado consumidor é muito acirrada, e, no caso dos jornais impressos, ela se dá entre os jornais locais, e, ainda, entre estes e os produzidos nos grandes centros urbanos que chegam facilmente ao interior. Hoje, os jornais on-line e a Web surgem também como desafios dentro deste mercado.

No caso específico das cidades de Uruguaiana e Santana do Livramento, os periódicos mais antigos de cada uma delas, embora tenham enfrentado momentos de dificuldade em suas trajetórias, conquistaram espaço e credibilidade junto aos moradores locais, constituindo-se quase que em porta-vozes oficiais de suas comunidades. O laço existente entre os jornais e as comunidades onde são consumidos, dado em parte, pela circulação continuada por um longo período de tempo, foi um dos critérios utilizados para a sua seleção para compor o corpus deste estudo.

Desta forma, em Uruguaiana, optou-se pelo O Jornal de Uruguaiana, também denominado simplesmente pelos uruguaianenses como O Jornal, transformando os concorrentes em mídias secundárias. Em parte, isto se justifica, pois ele é o mais antigo, com mais de 20 anos de existência.

O jornal que circula em Livramento, e o mais considerado pela comunidade local, é A Platéia. Embora criticado por alguns leitores, situação normal na relação entre os veículos de comunicação e seu público, o periódico se mantém atuante há mais de 60 anos. Já passou por várias administrações, mas prossegue desempenhando o papel de órgão de divulgação respeitado, sendo uma referência para os habitantes do lugar.

Ambos os veículos, acima citados, dirigem-se a um público com características peculiares: habitantes de municípios fronteiriços, tendo em seu quadro de leitores tanto brasileiros como argentinos e uruguaios.

Como também já foi definido, um jornal de Paso de Los Libres - El Interior - e outro de Rivera - Norte - terão seus textos analisados para que seja possível estabelecer um contraponto entre estas mídias fronteiriças, do lado de cá e do lado de lá. Cabe, pois, fazer um breve relato descritivo destes dois jornais.

Embora tenhamos trabalhado com a denominação Uruguaiana-Libre e Livramento-Rivera, torna-se importante esclarecer que o trânsito dos povos destas três nacionalidades é freqüente na linha divisória dos territórios. Isto é, no deslocamento de Uruguaiana para Livramento, é constante a presença de argentinos e uruguaios nos ônibus que ligam as cidades citadas - e mais Quaraí e Barra do Quaraí, Artigas e Bella Unión, as primeiras brasileiras e as segundas uruguaias, que fazem divisa entre os dois países.

Como já foi destacado, além do fluxo motivado por questões ligadas ao comércio local, existem também as relações de parentesco e de amizade, que influenciam esse trânsito transnacional.

Na região, as atividades voltadas à agricultura e à pecuária, importantes em ambos os lados das linhas divisórias, são fortes, e, como a divisa se dá por meio de fazendas nas áreas rurais, o trabalho na campanha torna-se outra forma de contato e interação, pois a "peonada71" circula pelas propriedades das zonas fronteiriças dos três países, podendo se configurar em possíveis leitores e sujeitos das notícias.

Após estes rápidos esclarecimentos, passamos a fazer o relato sobre os jornais fronteiriços trabalhados e suas realidades.

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5.1 Jornais de Uruguaiana-Libres

A) O Jornal de Uruguaiana

Uruguaiana possui quatro jornais locais circulando, mas O Jornal de Uruguaiana, fundado em 1º de maio de 1980, é o mais antigo72. Conforme um dos jornalistas há mais tempo na casa73, o veículo:

Surgiu há 20 anos, com dois casais de jornalistas que já haviam passado por outros jornais. O objetivo deles era falar do universo de Uruguaiana, já que na época não existia jornal na cidade. Uruguaiana tinha fama de cemitério de jornais, mas a proposta foi boa e impôs um estilo. Um ano depois, só o João Carlos, o Joca, ficou com o jornal, que era feito artesanalmente. As laudas iam a São Borja, o jornal era semanal. Muitos foram alunos deles. Mais tarde, compraram uma impressora e ficou bissemanal. O periódico enfrentou enchentes que dificultavam as idas e vindas do jornal. Depois foi vendido para a dona Zaira, proprietário do jornal A Razão, de Santa Maria, que ficou com o jornal por dois anos, quando vendeu para os atuais donos74.

Os donos atuais da empresa Edições Fronteira Oeste Ltda. compraram o jornal em meados de 1999. Ele, advogado, presidente local de um partido político, candidatou-se a uma vaga à Câmara de Vereadores, em 2000, mas não se elegeu; ela, de família de pecuaristas tradicionais da região.

Como tantas outras, as empresas de comunicação no interior sofrem com a distância das grandes cidades. Por este motivo, surgem alguns problemas que se refletem na estrutura interna da organização, no seu quadro de pessoal e no resultado final, o jornal.

No decorrer das visitas realizadas ao veículo, algumas alterações ocorreram. Três jornalistas ocuparam o cargo de chefe de redação no período compreendido entre os meses de julho e dezembro de 2000, acumulando a função de diretor de marketing da empresa. O setor comercial, por sua vez, fica nas mãos de uma pessoa que é considerada gerente administrativo da instituição, controlando o setor financeiro, comercial, de pessoal e supervisionando o setor de assinaturas.

A distribuição dos funcionários, por volta do mês de outubro de 2000, estava assim configurada: dois diretores, duas pessoas no setor administrativo/financeiro, uma na área de marketing e diretor de redação, dois diagramadores, sete entregadores, seis redatores, quatro funcionários para atender anúncios e vendas, um funcionário designado para o setor de impressão, dois para o setor de assinaturas, um fotógrafo, contatos em outros veículos que servem para realizar troca de informações, que funcionam como correspondentes; e o setor de contabilidade e o jurídico, que são terceirizados.

Segundo a opinião dos diretores do jornal, o pessoal não é suficientemente treinado, nem preparado. O nível de escolaridade é baixo - a formação é em nível de ensino médio. Um dos repórteres apenas iniciou o curso de Letras, o fotógrafo é formado em Filosofia e leciona em uma escola de ensino médio na cidade.

Passaram pela redação jornalistas credenciados, com experiência em outros jornais, e que dividiam suas atividades profissionais atuando em outras mídias como em emissoras de rádio local ou prestando assessoria de imprensa a políticos.

A redação está relativamente bem equipada com computadores, onde há programas com editores de textos e edição. Até a metade do mês de outubro, o jornal era diagramado e impresso na própria empresa, no mesmo prédio. Mas, a partir deste período, a empresa fechou uma parceria com outra empresa jornalística de Paso de Los Libres, ficando estabelecido que, a partir daquele mês, o periódico seria impresso nas rotativas do jornal de Libres - El Interior. Outro ponto acertado foi a definição de que seriam publicadas notícias de Libres em O Jornal de Uruguaiana e vice-versa. As notícias da Argentina, estampadas nas páginas do jornal brasileiro, ficariam em espanhol e as notícias do Brasil, publicadas no veículo de Libres, em português. A previsão era de que tais veiculações ocorreriam aos sábados em ambos os jornais.

O jornal argentino circulava diariamente, mas, no final daquele ano a periodicidade foi alterada para cinco vezes por semana. Sua circulação atinge um perímetro que engloba mais de dez cidades da Província de Corrientes. Também são produzidos na cidade de Libres outros dois periódicos. Além desses, cerca de sete jornais argentinos, entre eles El Clarín, podem ser encontrados nas bancas de revistas da cidade, que não são muitas. O mesmo não acontece em Uruguaiana onde são oferecidos nas bancas apenas os jornais mais fortes da capital do estado gaúcho.

Até o início do segundo semestre do ano de 2000, a tiragem d'O Jornal era de, aproximadamente, 4 mil exemplares por edição, entretanto, até o final do mesmo ano, este número caiu para 1.200. Na primeira metade do ano, o jornal era editado três vezes por semana - terças, quintas e sábados - mas, no quarto trimestre, passou para apenas duas vezes - quartas e sábados. O jornal é distribuído a partir das 6h30m da manhã, e algumas entregas são feitas como cortesia, entre essas a Delegacia de Polícia, as Aduanas (hoje unificadas), a Câmara de Vereadores etc.

Em agosto de 2000, estavam cadastrados cerca de 1.900 assinantes, a maioria composta por pessoas físicas. Este número foi reduzido a 700 em dezembro do mesmo ano. No grupo dos assinantes, existem alguns poucos moradores das cidades vizinhas e até mesmo de outros estados que possuem fortes laços com a comunidade local - ou por serem naturais da região ou por terem residido na cidade algum tempo (ou ainda por interesses profissionais e econômicos em Uruguaiana e arredores), motivo pelo qual querem continuar recebendo informações da fronteira.

Houve um período, durante o segundo semestre do ano de 2000, em que havia um espaço nas páginas d'O Jornal dedicado à Barra do Quaraí, mas que foi excluído quando o veículo passou a ser editado apenas duas vezes por semana. Da mesma forma, duas vezes por mês, sempre aos sábados, circulava um caderno especial sobre cultura. Todas as quintas-feiras era publicada a página sobre tradicionalismo, que mais tarde passou a ser diluída nos assuntos gerais, embora o tema seja relevante para a região que cultiva os hábitos e tradições gaúchas.

O jornal tem como política editorial dar ênfase às notícias locais até porque muitos dos assinantes também são leitores dos jornais Zero Hora e Correio do Povo. O material que fala de modo mais global sobre as questões internacionais é retirado, não raras vezes, de informações provenientes da Internet. Os responsáveis pela produção das notícias dão especial atenção aos assuntos da área policial e algumas questões regionais, nacionais e internacionais que envolvam o local, que se tornam tema de interesse da comunidade. Os outros quatro pequenos jornais editados na cidade, que dividem o mercado, não representam competidores fortes.

Devido ao comércio entre as duas cidades fronteiriças, encontram-se anúncios de estabelecimentos comerciais de Libres no jornal de Uruguaiana. Mas como já foi ressaltado anteriormente, raras são as vezes em que os repórteres se deslocam ao município argentino com o intuito de buscar informações para elaborarem matérias sobre os moradores da cidade vizinha e arredores.

Faz parte da política da empresa manter relações estreitas com a comunidade. O Jornal de Uruguaiana procura se fazer presente nos eventos locais. Há a preocupação de manter trocas de informações, configurando-se uma comunicação de dupla via, onde o leitor é parte importante para a empresa. As edições de quartas-feiras possuíam em torno de 16 páginas, e as de domingo, em média, 32 páginas75.

B) El Interior

Com o intuito de realizar uma análise comparativa pontual, foram coletados exemplares do periódico denominado Semanário Horizonte76, jornal de Paso de Los Libres em circulação há oito anos, que traz no cabeçalho da capa a informação de que a distribuição do veículo é feita em Libres e Uruguaiana. A idéia inicial era analisar como se apresentava a fronteira nas páginas do periódico e verificar como as eleições brasileiras, em nível municipal, em especial em Uruguaiana, repercutiram naquela cidade argentina. Foi possível coletar os exemplares dos dias 23 de setembro e 07 de outubro - o jornal do dia 30 de setembro não foi publicado, pois a empresa estava em período de férias coletivas. Constatou-se que nada foi publicado sobre o evento brasileiro.

Após uma rápida observação no jornal Horizonte, percebeu-se que havia notícias sobre Uruguaiana em suas páginas, tratando do desfile comemorativo da Semana Farroupilha ou incidentes policiais envolvendo libreños em território fronteiriço brasileiro. O símbolo da Ponte Internacional também faz parte de anúncios publicitários no jornal de Libres assim como temáticas ligadas à aduana (unificada com a aduana brasileira) e contrabando, assuntos próprios aos espaços de fronteiras nacionais.

Apesar de o Horizonte ser um jornal mais antigo, a escolha do material para análise recaiu sobre outra alternativa que foi coletar os dois primeiros exemplares de o jornal El Interior, veículo que trouxe de volta à região o jornal diário77, que Libres já não possuía há alguns anos. Este jornal pertence à empresa que firmou o Acordo de Mútuo Interesse com O Jornal de Uruguaiana. Pelo acordo, os textos seriam agrupados de modo a compor um Caderno de Intercâmbio, veiculado na parte interna do veículo. O acerto previa também, que O Jornal de Uruguaiana seria impresso nas rotativas d'El Interior. Estes elementos reforçaram nossa posição em utilizar publicações deste periódico como contraponto no estudo. Passamos então a descrever esta mídia local.

O jornal é uma experiência nova na Província de Corrientes e visa abranger diariamente uma série de cidades ao redor de Paso de Los Libres, incluindo o município brasileiro de Uruguaiana. As páginas internas estão subdivididas em espaços cujo foco central são os Departamentos que compõem o sul da Província e ficam assim distribuídas: Mercedes (acompanhando a denominação de Locais), Curuzu Cuatia (com o esclarecimento das temática abordadas, Política e Cultura), Monte Caseros (com Política e Produção), Paso de Los Libres (com Locais e Política), e a cidade brasileira, Uruguaiana (com a caracterização de notícias como Geral).

Na parte superior da capa e da contracapa a cor verde acompanha o preto na impressão e, em desacordo com o que ocorre normalmente, ao invés de estar estampado o nome da cidade onde o veículo é produzido, vem os dizeres "Interior de Corrientes", seguido da data, ano, número e preços - em pesos - da publicação. São 24 páginas contendo o Editorial, a Palavra do Leitor, Expediente, as seções dos Departamentos (já citadas acima), Esporte, Economia e Social. Na capa, a manchete principal e outras chamadas e na contracapa o horóscopo e anúncios publicitários, para os quais pouco espaço é reservado nas páginas internas.

Os dois primeiros exemplares do jornal El Interior foram selecionados para a análise - o de n.º 1 e de n.º 2 -, do ano 1, cuja circulação já iniciou com o encarte em português. Conforme ficou estabelecido no acordo, quem selecionaria as matérias a serem encartadas nos dois veículos seriam os diretores do El Interior, onde ambos os jornais são impressos.

Nos dias 15 (domingo) e 17 (terça-feira) de outubro de 2000, primeiros números onde circulou o encarte em português, duas páginas são reproduzidas na íntegra de O Jornal em El Interior, inclusive com o cabeçalho copiado, com as páginas inteiras de O Jornal e com a data do jornal brasileiro - de 14 de outubro. O detalhe fica por conta de que a página de número 21 é a mesma nas duas edições com a coluna assinada pelo historiador Daniel Fanti que fala de "Uruguaiana de antes...", relatando o acontecido em um dos barcos a vapor que circulava pelo Rio Uruguai, por volta de 1913. Outro texto reproduzido é assinado pela diretora d'O Jornal e relata um acontecimento ocorrido no Rio de Janeiro, em 1927, envolvendo o empresário Assis Chateaubriand.

A reprodução da página 20 do dia 15 de outubro dos textos em português, trazidos pelo jornal El Interior, são da seção de Esporte onde são tratados os assuntos relativos ao Campeonato de Futebol dos Veteranos Quarentões, à terceira rodada da Liga Amadora Uruguaianense 2000, ao Campeonato Estadual Série Ouro, à Liga Uruguaianense de Futebol Veterano, além de notas que ficam estampadas na coluna Multi-esporte, que trata de jogos de futsal e a Copa Super Master - Cinqüentões. Dois anúncios publicitários são colocados na parte inferior da página, um de O Jornal de Uruguaiana e outro de uma empresa de serviços funerários de Uruguaiana.

A página 20 do dia 17 traz a coluna assinada pelo árabe-palestino, Omar Tomalih, com dois texto, sendo um deles intitulado "Temos ou não o direito de viver" e o outro, "O caminho da paz". Outro material impresso nesta página fala sobre a réplica da cruz utilizada na primeira missa rezada no Brasil, divulgando a exposição deste objeto em Uruguaiana, prevista para os dias seguintes. Uma decisão da Câmara de Vereadores de Uruguaiana com relação às famílias das vítimas do incêndio que destruiu uma creche da cidade, no ano anterior, é outra das matérias que compõem a página. Ao final dessa, segue um edital de intimação assinado pela Primeira Vara Cível da Comarca de Uruguaiana.

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5.2 Jornais de Livramento-Rivera

A) A Platéia

O jornal A Platéia circula pela região fronteiriça há mais de 60 anos78. Por ele, passaram jornalistas que conquistaram destaque nos veículos da capital e de cidades importantes do interior do Rio Grande do Sul. Hoje, a empresa está nas mãos de seu quarto proprietário, uma família de origem palestina, sendo dirigido pelo pai e o primogênito, ambos advogados e donos de outros estabelecimentos comerciais na cidade. Preocupados com o sucesso da empresa e vendo-a como um empreendimento, os dois, mesmo atuando na área advocatícia, acompanham as atividades do jornal, decidem qual será a pauta e as notícias publicadas.

A JB Empresa Jornalística Ltda., edita dois periódicos: A Platéia, que circula de terças às sextas e aos domingos, e o Jornal da Semana, publicado só aos sábados. As duas mídias são produzidas no mesmo local, com a mesma equipe79. A organização está situada em um prédio comercial, edifício localizado defronte ao Parque Internacional, de onde é possível avistar com facilidade as ruas de Rivera.

Como acontece com O Jornal de Uruguaiana, a equipe de profissionais responsáveis pela elaboração do periódico é composta por jovens que não possuem formação específica na área de comunicação, com escolaridade em nível de ensino médio. Confirmando o fato de haver poucas pessoas qualificadas para trabalhar nas mídias do interior, uma das repórteres saiu de A Platéia no mês de dezembro de 2000 e foi trabalhar n'O Jornal de Uruguaiana.

Segundo a direção, os métodos de trabalho empregados pelos funcionários são considerados bons, embora estes não estejam capacitados como deveriam já que o nível de especialização do grupo é considerado razoável. Para melhorar os resultados, a empresa contratou profissionais que ministraram cursos de reciclagem e atualização na área técnica, fazendo com que os redatores tivessem mais condições de manusear os computadores.

A função de redator-chefe ou editor não é bem definida dentro da instituição. Os diretores participam ativamente da coordenação dos trabalhos exercendo, por vezes, este papel. A Platéia possui um plantel de cerca de 40 empregados distribuídos internamente de acordo com as áreas de atuação. Dentre os repórteres-redatores, existe uma jovem que atua na instituição há mais de três anos que, pela experiência adquirida, é uma referência e respeitada pelos colegas do grupo.

A equipe de repórteres-redatores é composta por cinco pessoas que cobrem as notícias para as editorias de esporte, social, geral, polícia e política. Também faz parte deste grupo um fotógrafo. Três empregados são denominados de paginadores e organizam as matérias nas páginas do jornal, que conta ainda com o trabalho de dois digitadores que passam para os computadores textos que chegam datilografados ou manuscritos à redação, provenientes de colaboradores, entre outros.

Faz parte da área administrativa o setor de assinaturas e circulação, coordenado por um rapaz - um dos funcionários mais antigos, atuando há treze anos na empresa. Ele dirige um grupo de dez entregadores e seis jovens que executam telemarketing, renovando e vendendo assinaturas; ficando os anúncios sob responsabilidade de outro funcionário. Uma jovem atende o telefone e atua como recepcionista, e a parte de pessoal tem outro encarregado. A contabilidade é terceirizada, e, quando necessário, um fotógrafo é contratado para coberturas específicas.

Noutro prédio está instalada a gráfica que imprime os dois periódicos da empresa e presta serviço para instituições diversas imprimindo publicações em geral. Neste espaço, trabalham oito pessoas e mais um profissional responsável em extrair da Internet as notícias que chegam da Agência Estado de São Paulo (da qual são clientes) e que dizem respeito aos assuntos nacionais e internacionais. Este material é utilizado para preencher as lacunas que ficaram em aberto no jornal. Tal tarefa é realizada à noite, depois que a edição foi fechada na redação. Quem definia que notícias ocupavam estas brechas era, até novembro de 2000, uma pessoa que atuava durante o dia em um dos jornais de Rivera.

Preocupado em envolver-se com a comunidade, o jornal A Platéia participa de campanhas institucionais como a do "Rebaixamento das Calçadas" e do "Módulo do Corpo de Bombeiros". Estimula a participação do leitor, cujas opiniões se fazem presentes nas páginas do periódico muito embora não haja um espaço destinado exclusivamente para estas falas. Existe um grupo de colaboradores que envia, sistematicamente, material para o jornal, mas não faz parte do corpo de funcionários. Áreas como cultura - cinema, vídeo, música - são atendidas desta forma.

A direção de A Platéia não considera os outros jornais editados em Livramento e Rivera como concorrentes. Um destes jornais brasileiros é semanal, denominado Folha Popular80 - pertencente ao dono anterior d'A Platéia. Tais mídias não apresentam uma configuração jornalística nos moldes dos jornais tradicionais. Parecem-se mais com informativos volantes, onde não consta o nome da empresa que os produz nem seus responsáveis. Um dos periódicos de Rivera é mais consistente, mas de formatação pequena - 12 páginas de 23cm x 33 cm. O outro, um pouco maior, mas com o mesmo número de páginas. Os atuais proprietários d'A Platéia entendem que o Correio do Povo absorve uma gama maior de leitores locais, por trazer diariamente informações sobre as cidades do interior do Estado, configurando-se num competidor mais forte, mas nem por isso perigoso.

O número de assinantes no início do segundo semestre de 2000 girava em torno de 1.900, chegando ao dobro do que era um ano atrás, mas decaindo em dezembro de 2000 para 1.800 assinaturas. Dentro do grupo de assinantes locais estão alguns moradores de Rivera, em grande parte brasileiros ou com dupla cidadania. O jornal é enviado também para atender cerca de 15 assinantes que moram fora de Livramento e fora do Estado. No final do ano de 2000, a tiragem estava fixada em 2.500 exemplares.

Não muito diferente do que ocorre em Uruguaiana, nas bancas da cidade só pode ser encontrado um jornal publicado em Porto Alegre, e, uma vez por semana, a partir de encomendas, os santanenses podem adquirir - na segunda-feira - o Jornal do Brasil do sábado e do domingo anterior. Como ocorre em Libres, nas bancas de Rivera circulam os jornais uruguaios locais - Norte e Jornada, este com assinantes em Livramento - e outros quatro nacionais publicados em Montevidéu. Dois destes, - um é o El País -, estão nas bancas, mas só para atender encomendas dos leitores.

O responsável pelas duas páginas em espanhol, publicadas por A Platéia, é um jornalista uruguaio que também atua em outras mídias em Rivera. Em outubro de 2000, esta seção foi ampliada para quatro páginas e foi contratado outro jornalista de Rivera, que também exerce a profissão na cidade uruguaia. Os exemplares editados nos dias úteis, isto é, de terça a sexta-feira, possuem de 20 a 24 páginas. O jornal que circula no domingo é composto por mais ou menos 46 páginas, o que o diferencia dos outros periódicos do interior, elaborados com um menor número de páginas81.

B) Norte

De Rivera, foram coletados dois jornais: Norte, com circulação matutina82, e Jornada, com circulação vespertina. O primeiro deles é o mais antigo, fundado em 1953, mas convertido em periódico diário em 1956, com exceção de domingos e feriados. O segundo, um pouco mais novo, com dezesseis anos de existência, circula na região também diariamente, excetuando-se os domingos e feriados.

A coleta ocorreu de 25 a 30 de setembro de 2000. Esse período foi escolhido com a intenção verificar o tratamento dado à fronteira na mídia uruguaia, tendo em vista as repercussões do processo eleitoral brasileiro naquela cidade. Como as eleições modificam a composição dos postos governistas locais, esse processo pode afetar as relações entre os dirigentes e legisladores municipais das duas cidades fronteiriças.

Como a análise deste material serviria de contraponto aos jornais brasileiros selecionados, e como nenhum dos dois veículos uruguaios possui um caderno em português, considerou-se que o jornal publicado em Rivera há mais tempo, o periódico Norte, seria o escolhido. Vale ressaltar que, após uma primeira leitura nestes jornais, percebeu-se que tanto Norte como Jornada apresentam textos noticiosos e anúncios publicitários sobre Santana do Livramento, assim como a campanha eleitoral e o desfile da Semana Farroupilha. O primeiro dá mais destaque às notícias locais e o segundo abre um espaço um pouco maior para temáticas internacionais.

O jornal Norte completou 48 anos, no ano de 2000, sendo, assim, menos antigo do que A Platéia, de Livramento. Editado de segunda a sábado e impresso em P&B, possui uma tiragem de 3.500 exemplares, distribuindo suas notícias nas 12 ou 14 páginas, cujas dimensões giram em torno de 34cm por 23cm, sendo um pouco menor do que uma folha padrão A3. Embora veicule anúncios de Montevidéu, abrange, além da própria Rivera, os municípios do Departamento de Rivera mais próximos da capital - como Tacuarembó, Tranqueras - e a brasileira Santana do Livramento.

O jornal não possui seções definidas, mas procura manter uma seqüência nas temáticas abordadas. Traz na capa de uma a três matérias e algumas chamadas de notícias internas; na contracapa, o tema é esporte, sendo que a expressão Deportes sempre está estampada no cabeçalho sobre a logomarca. Na página dois, encontram-se dois boxes, um deles com o expediente e o outro com as previsões meteorológicas, e a seção de classificados. Na página quatro, é veiculado o Guia de Profisionales, com anúncios de profissionais liberais, como advogados, agrimensores, tradutores etc.

Há também, diariamente, uma página ou coluna dedicada aos editais oficiais sobre questões agrárias, as proclamas nupciais etc. Política local, regional, nacional e internacional, assim como economia, ficam distribuídas pelas demais páginas. Temas ligados à vida social e à cultural da comunidade encontram-se em uma das páginas finais do jornal, onde são divulgadas festas, aniversários e eventos em geral. Questões voltadas para o setor agropecuário também recebem espaço no jornal.

Embora nem sempre esteja estampado no texto que o anunciante é de Livramento, podem ser encontrados anúncios de estabelecimentos brasileiros que oferecem seus produtos e serviços aos vizinhos uruguaios. Seus textos geralmente estão escritos em espanhol, inclusive os anúncios da campanha eleitoral brasileira de 2000, direcionados aos cidadãos "doble chapa" - aqueles que têm direito de votar tanto no Brasil como no Uruguai.

A estimativa, segundo o próprio jornal83, é de que cerca de quatro mil cidadãos brasileiros residem em Rivera, por isso a importância de atingir este público. Verifica-se que a presença de cidadãos com dupla nacionalidade é tema recorrente na região, e, com o objetivo de atender tal clientela, advogados de Santana do Livramento oferecem seus préstimos aos uruguaios interessados na obtenção da cidadania brasileira. A vinculação entre os moradores de ambos os lados também pode ser vista nos proclamas de casamentos onde há enlaces entre cidadãos de nacionalidade oriental (como os uruguaios se autodenominam) e cidadãos brasileiros, moradores de Livramento ou Rivera.

Diferente do que ocorre em A Platéia, Norte pouco fala em seus textos sobre a fronteira. O enfoque dado é mais no sentido de Rivera como um Departamento cuja ligação mais forte é estabelecida com a capital e os demais municípios uruguaios que a cercam. Isto não quer dizer que acontecimentos envolvendo Livramento e sua população não sejam abordados pelo periódico, mas se verifica que, a partir linha editorial adotada, nem tudo é destacado como se permeado pelo fenômeno fronteira.

O status de capital departamental concede à Rivera uma vida própria, uma posição central, ao redor da qual giram os municípios vizinhos. À Rivera é dado lugar de destaque pelo governo federal uruguaio, por ser sede dos representantes de instituições nacionais, bem como dos organismos ligados ao governo regional. Do mesmo modo, em relação às demais cidades selecionadas para o estudo - Santana do Livramento, Uruguaiana e Paso de Los Libres - a proximidade de Rivera com a capital federal de seu país é bem maior do que se estabelecermos esta mesma relação - distância em quilômetros - dos outros municípios brasileiros com Brasília e da cidade fronteiriça argentina com Buenos Aires.

Por todos os vínculos que Rivera possui com os municípios do Departamento de mesmo nome e Montevidéu, e a responsabilidade que possui em administrar a região, os acontecimentos trazidos pelo jornal Norte dividem-se de modo a atender as necessidades de informação dos habitantes da comunidade local bem como de toda a população do Departamento de Rivera, explicando-se, em parte, a não-vinculação de grande quantidade de notícias ao fenômeno fronteira.

* * *

As informações apresentadas neste item sobre a morfologia dos jornais servem de referência para que seja criado um esboço, uma imagem mínima sobre estes jornais interioranos, direcionados para suas comunidades, cada uma delas com características próprias, mas com um elemento comum, a presença da fronteira. E para entendermos quais os recursos, técnicas, estratégias e modos de operação que estes veículos lançam mão para apresentar as notícias sobre a fronteira, iremos focar a parte seguinte do estudo na análise de textos estampados nos jornais que dizem respeito ao fenômeno nestes espaços.

71 Homens que fazem as lides campeiras.
72 Um exemplar do Jornal de Uruguaiana tem sua capa reproduzida no Anexo 3.
73 Confirmando a rotatividade de que falamos anteriormente, o profissional que concedeu a entrevista deixou a organização ainda no início do segundo semestre de 2000.
74 Palavras do jornalista, radialista, poeta e compositor de música nativista Francisco Alves.
75 Ver no Anexo 4, a morfologia de O Jornal de Uruguaiana em dezembro de 2000.
76 Segundo informações do jornalista Carlos Lossada, hoje diretor d'El Interior, há anos atrás, quando atuava no Semanário Horizonte, este publicava duas páginas em português.
77 O Anexo 5 exibe uma capa de El Interior.
78 A capa de um dos exemplares analisados de A Platéia está reproduzida no Anexo 6.
79 Em 2001, a equipe de produção dos dois jornais estava sendo dividida em dois grupos.
80 No ano de 2001, o semanário foi adquirido pela JB Empresa Jornalística Ltda., ficando todos os jornais impressos de Santana do Livramento nas mãos dos mesmos proprietários.
81 Ver no Anexo 7, a morfologia do jornal A Platéia, no segundo semestre de 2000.
82 A capa de um dos exemplares de Norte está reproduzida no Anexo 8.
83 Norte. Rivera: 29 de set de 2000, p.7.

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